A Virginia, o quarto e a o não querer saber de tudo sempre
E a importância de fazer perguntas
Estou desde domingo doente. Peguei uma gripe daquelas que há muito tempo não tinha, aliás, eu quase não tenho ficado doente e isso é bom. Eu, como eu acho que talvez você que me lê, sou uma daquelas pessoas que não gosta de ficar doente. Eu entrava num looping de frustração terrível. Mas dessa vez não. Consegui soltar.
Entendi que era pra parar, pra descansar, pra cuidar. Não me senti mal por não escrever ou por não fazer exercício físico. Não fui dura comigo. Tá, só chorei uma vez de cansaço. E, olha, é bom também ter uma vitória dessas vez ou outra.
Me senti essa semana num hiato. E dessa vez o hiato não me causou ansiedade. Como não tem me causado ultimamente. A vida acontece, independentemente do que eu fizer e isso é bom. E não é só por isso que eu vou deixar de fazer também.
Fiquei com vontade de ficar quieta, comigo e, claro, mais uma vez arrumar a casa, minha mesa, meu quarto, meu reino, meu teto todo meu. E lembrei de um texto da Virginia Woolf que já li em algum momento no instagram e que fala sobre essa nossa ocupação tanto interna quanto externa. Ela leu esse texto em 1931 na Sociedade Nacional de Auxílio às Mulheres.
Nesse caminho novo que se coloca pras mulheres, Virginia fala com a plateia daquele dia sobre as chances de descobrir. O que seremos? Como seremos? Eu sinto que antes e hoje ainda estamos nessa jornada de não saber muito bem onde estamos no mundo mas sim entender que pisamos nele, vivemos nele, pertencemos em qualquer lugar.
E detalhe: da importância de fazer perguntas, mesmo que a gente não sabia as respostas ou sequer precise delas pra seguir em frente.
Chega de enrolação e segue aqui um trecho do texto pra gente lembrar e pensar um pouco sobre quem somos neste mundo:
“Na verdade, penso eu, ainda vai levar muito tempo até uma mulher possa se sentar e escrever um livro sem encontrar com um fantasma que precise matar, uma rocha que precise enfrentar. E se é assim na literatura, a profissão mais livre de todas para as mulheres, quem dirá nas novas profissões que agora vocês estão exercendo pela primeira vez?
São perguntas que gostaria de lhes fazer, se tivesse tempo. Na verdade, insisti nessas minhas experiências profissionais, foi porque creio que também sejam as de vocês, embora de outras maneiras. Mesmo quando o caminho está nominalmente aberto — quando nada impede que uma mulher seja médica, advogada, funcionário pública -, são muitos, imagino eu, os fantasmas e obstáculos pelo caminho.
Penso que é muito bom e importante discuti-los e defini-los, pois só assim é possível dividir o trabalho, resolver as dificuldades. Mas, além disso, também é necessário discutir as metas e os fins pelo quais lutamos, pelos quais combatemos esses obstáculos tremendos. Não podemos achar que essas metas estão dadas; precisam ser questionadas e examinadas constantemente.
Toda a questão, como eu vejo — aqui neste salão, cercada de mulheres que praticam pela primeira vez na história não sei quantas profissões diferentes -, é de importância e interesse extraordinário. Vocês ganharam quartos próprios na casa que até agora era só de homens. Podem, embora com muito trabalho e esforço, pagar o aluguel. Estão ganhando suas quinhentas libras por ano. Mas essa liberdade é só o começo; o quarto é de vocês, mas ainda está vazio. Precisa ser mobiliado, precisa ser decorado, precisa ser dividido. Como vocês vão mobiliar, como vocês vão decorar? Com quem vão dividi-lo, e em que termos? São perguntas, penso eu, da maior importância e interesse. Pela primeira vez na história, vocês podem fazer essas perguntas; pela primeira vez, podem decidir quais serão as respostas. Bem que eu gostaria de ficar e discutir essas perguntas e respostas — mas não hoje. Meu tempo acabou, e paro por aqui”.
Segunda-feira tem pergunta para os assinantes pagos! Até lá.
Beijos,
Tati