Eu sei. Ninguém quer falar de morte. Eu mesma não sei se quero.
Se você é como eu (não gosta de falar de morte) vai querer passar por esse texto rapidinho. Vai fazer uma leitura dinâmica para não perder nada porque vai que eu digo algo interessante, né? Vai olhar os links lá embaixo e pronto, lá foi mais um email que você leu neste dia atribulado e cansativo.
Mas, calma.
A gente vive e morre todo dia. Todo dia.
Morrer, acabar, não ter mais. É um medo que atravessa nossos corpos mesmo que a gente não queira. Mesmo que a gente não veja.
Tenho tido medo de morrer. Acho que é um fenômeno pós-40, pós-pandemia, sobrevivemos o pior, então deixar eu aproveitar, tem sido meu modo.
Tenho tido pânico de viajar de avião, esse é o sinal número um. Pânico que precisarei encarar na sexta que vem, e na segunda de novo, amém. Um pavor de morrer e não dar tempo de fazer tudo o que eu quero fazer, de não realizar sonhos, ver as crianças cresceram, escrever mais livros, ir pra Paris de novo, etc, etc…
Falta de controle que chama. Uma das coisas que desencadeiam esse medo e que aprendemos depois do 40 e crise mundial. Não temos controle de nada.
Resgatei parte desse texto de uma newsletter que já tinha enviado com um exercício de escrita muito precioso, que talvez você aí do outro lado da tela esteja precisando fazer. O exercício surgiu depois de um email da escritora americana Emma Straub que tinha acabado de perder o pai.
Emma se inspirou num poema da maravilhosa poeta Lucille Clifton para escrever para o seu pai. Para lembrar de todas as vezes que não morremos, para lembrar de todos os dias que sobrevivemos. Lucille escreve:
"Come celebrate
with me that everyday
something has tried to kill me
and has failed"
Que na minha tradução livre é assim:
"Veja celebrar
comigo todo dia
que algo tentou me matar
e falhou"
O poema da Emma era esse aqui:
Todas as coisas que não mataram meu pai
O carro que o atropelou quando tinha sete anos,
O homem que o tocou num cinema,
Vinho, vodka, Fiddle Faddle, tabaco
E o conteúdo oculto de suas gavetas de mesa.
O Mercedes champagne de dois lugares
As estradas rurais escorregadias e verdejantes.
Nova York na década de 1980.
Minha paciente mãe.
O Concorde, que sem dúvida poderia ter
Explodido em metade do tempo.
O QE II, que poderia ter encontrado
Seu próprio icebergue.
Connecticut.
Fascistas de escola preparatória do Meio-Oeste.
Seu pai.
Uma sombra, um doppelganger, ele mesmo.
O peso do meu afeto sincero.
Quando os jornais imprimem
A causa da morte, eles deveriam listar
Tudo o que falhou.
Em sua mensagem de saída, ele ainda diz
Seja sucinto, mas descubro que não consigo.
Sempre há mais a dizer.
Li o fim aos prantos. Por ela, por mim, por todos que morremos um pouco. E pensei que lindo exercício de escrita para fazer por nós mesmas ou por pessoas que amamos e já foram.
E todas as vezes que ele ou ela não morreram? E todas as vezes que você não morreu?
Escreve num papel: "Todas as coisas que não me fizeram morrer" ou "Todas as coisas que não mataram ...."
Experimenta, lembra e escreve.
Escrever é dar forma também para dor, também para o medo.
E por sorte, eu me lembro disso também, todo dia.
Até semana que vem,
Beijos
Tati
O que estou vendo:
O Regime
Resolvi arriscar essa série escrita por um homem por um motivo: Kate Winslet. E realmente vale a pena de mais. O Regime é uma minisérie sobre uma governante de uma nação europeia fictícia. Eu vejo tudo o que essa mulher faz por motivos de perfeita.
O que vou fazer:
Neste fim de semana estarei em Campo Grande (MS) e vou fazer um bate-papo e lançamento do Segundo 19, meu último livro. Vai ser interessante fazer esse movimento já que foi lá que eu me separei e parte da história que eu contei no livro depois aconteceu. Pra quem estiver na cidade: espero você lá!
Coisas que eu não deveria indicar:
Sim, é semana do consumidor e tem umas promoções muito boas no inimigo grande conglomerado pra não deixar de dar a dica. A primeira é:
Segundo 19 - Meu próprio livro: tá um preço ótimo por lá, viu? Quase 50% do valor original. Eu não ganho muito dinheiro com essa empreitada, mas eu quero é ser lida: então vai lá e se você já leu dá pra aquela amiga de presente :)
Blue Nights da Joan Didion tá só R$ 18,91. Esse livro é lindo demais, sobre morte tamb´me, sobre luto, sobre maternidade. Gosto bastante.
Triologia de Conpenhagen da Tove Ditelvsen tá só por R$13 no kindle. O livro físico custa em média R$ 70. Tá aí um bom negócio pra vocês. O livro são os diários dessa poeta maravilhosa e mãe de três.