Dizer não. Parece fácil. Parece simples. Mas não é. Não: é.
Especialmente, vamos combinar, se você é uma mulher. Crescemos e, aprendemos ao longo do caminho, a agradar. A querer ser aceita. E isso implica dizer sim, mesmo quando a gente não quer. Implica não sustentar desconfortos. Ou a não criar atrito.
Dizer não. Parece óbvio. Não é.
Eu que já li Simone de Beauvoir, bell hooks e Rebecca Solnit. Já deveria saber.
Eu que já fiz lambe com os versos: “coloca teus limites, desenha tuas margens”. Já deveria saber.
Mas quando precisei dizer não, colocar margem, hesitei. Meu coração dizia: “não quero”. E aí a pessoa vinha com argumentos e eu dizia: “ai, tá bom, vou ceder um pouco, te encontro pra gente conversar”. Só que eu não queria. Não.
Quantas coisas fazemos sem querer fazer? Quantas vezes cedemos espaço pra o outro caber? Isso diminui horrores nossa chama interna, e murcha a gente por dentro. Todo mundo sabe disso, mas mesmo assim cai nesse lugar. Dizer não: é difícil sim.
Quando eu finalmente consegui dizer não para essa situação amorosa ( diga-se de passagem), me deu um alívio enorme e eu logo vi que eu tinha entrado no ciclo. Como mudar isso? Estar atenta aos sinais. E não ter medo de desagradar.
Por que a gente não consegue dizer não? Tem um trecho do livro Comunhão da bell hooks que ela diz:
“Uma mulher num relacionamento principal com um homem não podia dizer não, porque temia que houvesse outra mulher no segundo plano para tomar seu lugar, uma mulher que nunca diria não”.
Ultimamente, tenho pensado que talvez seja melhor a outra mulher, se quiser, dizer sim. E pra treinar tenho desenhado margens no meu caderno, uma forma de fazer feitiço e entender limites.
Que a gente continue atenta. Que não se esqueça de voltar pra gente e dizer não sempre que o coração mandar.
Pra ver
Eu amo filmes ou séries argentina e comecei a ver Invejosa no Netflix. Uma coisa leve e divertida, ainda que a ativista em mim morra com a falta de discussão sobre como o patriarcado influencia nos nossos desejos. Mas, eu me identifiquem demais com a franja da personagem principal e as piadas são ótimas.
Pra ler
Ela estava obsessiva, passava metade do dia citando bell hooks e a outra metade também. Mulheres, leiam e releiam Comunhão.
Pra escutar
Escrevi esse texto escutando a playlist do meu último livro, Segundo 19, e aproveitei o embalo e mandei uma mensagem pra alguém que eu precisava desenhar margem.